quinta-feira, 26 de junho de 2008

Então, tem poesia?

É apenas em algumas poucas ocasiões que se recita a poesia dos sons.

O que seria isto? Bom, veja bem...

É um pouco de ouvir a voz dos traços
Um certo baralhaço, um embaralhar (acho...)
Um embaralhar, arrumar de destacamentos,
Um aperceber de tato

É um tato partindo do ouvido
Capaz de tra,tra,trabalhar a noite inteira
É, sabe... coteira! coteira caindo sua água
Pingo, pingo, pin, pin, pa... pago.

Um pouquinho de s,s,s,s,s,serviço
De calma, é preciso calma,
Como? Pense redes... redes estendidas de espreguiçar

Um rebolar dos corpos presos
Das palavras seguradas, atadas ao papéis
Que em tinta têm cor, em rasgo vai letra, capote
Capote das letras, o som delas.

Tem que ser possível ouvir poesia.
Poesia que é som... sabe o quê?

Música!

É som.

Batuque em poesia
Batuque dez, nove, oito...
E vai! É batuque.

Pensa assim, ó...
Um,
S-k-r-a-tim-bum!

Igual aquele desenho...

Naquele desenho havia uma generosa dose de poesia

Havia uns jogados nas falas
Os personagens não falavam apenas para trasmitir
Passar apenas, de modos binomiais
Um grande e enorme binômio,
Não era assim.

Era um senso de alegria em som.
A alegria que cantava sem se passar
Sem ir mais do que ia
Sem valer de interrupções do sentido
Da mensagem
Era assim.

Então, tinha som.
Tinha som, sabe.

E a poesia de hoje - se é que temos poesia
Ah, a poesia de hoje é uma mudez que só vendo

A poesia hoje, bom, não pensa.
Age e sente como se pensar não pudesse.
Como se sentir não fosse pensar
Como se pensar não fosse sentir

É esta a tal moderna e contemporânea
Poesia de nossos tempos...

Sabe o que parece...
É que parece naquele revolta toda
Nós deixamos o susto vencer
Nós nos assustamos com tudo
E nos espantamos demais
Nos assombramos demais
Ficamos, com isso, meio cagão!
Sabe, o cagão? Esse mesmo.
Cagão.

Bom, esta é a nossa poesia.

Mas na verdade a gente não falava disso,
Né mesmo?
Falavamos de poesia e som.
Bom, poesia é som, não é verdade?

Mas, eu sei, deixe xingo para após,
Que eu sei,
Carece paciente ficar viu...
Paciente
Paciência? Só se for para ser paciente...
É assim a nossa poesia.

Então, poesia é som.
Tudo bem.
Mas é mais que isso
Ela se faz som, sabe como é?
Se faz.
Pretende
Poesia é pretenção
Não tem pretenção? Não é poesia. Não é.

Arrasta vontade... sabe disso?
Arrasta

Vontade, então... uns quereres de muito
Poesia tem disso também
Tem de querer e vontade mesmo
Desejo... de alguma forma

Mas é um desejo, assim, com som.
Desejo com musiquinha no ouvido
Desejo devagarzinho
Com vontadizinha...
Desejozinho...
Depois vai mais e cresce
Mas a poesia mesmo, de baixo, de começo
É bem devagarzinha mesmo
Desejozinho

Então cabe tudo isso, pois é.
Pois é sim.
Som, traço, jogo de riscos e rabiscos e papel.
Jogo, tem de ter jogo
Uma dosezinha, sem passar do ponto, de olho e olho.
Olho e olho, sabe aquele olhar?
Olho e olho, no olho mesmo
Aquele olhar de ver o outro
Saber que ele está ali, pronto e sabendo
E tendo som, ele está cantando.
Está rimando... e você, como está?
Sabe isso?. Pois é. Então é isso.
É o outro com o olho e o seu olho também nele.
É assim a poesia

Pois que então vejam
Resuminho pra facilitar, minha gente:
(viu, pus até dois pontos)

Poesia tem que ter conversa.
Tendo conversa tem tudo isso que falamos
Não tem conversa, então já foi...

Já foi mesmo.

Conversa, prosa, toma lá e dá cá...
Tendo isso, tá resolvido mesmo.

Tem poesia.

E, então, digo, em alto e bom tom:
Tem poesia?
E acho que tem.

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