terça-feira, 20 de setembro de 2011

A mirada do pássaro

Várias coisas tomam nossa atenção, mas sem nós mesmos quedamos sós. O que fica de toda a interação frenética, as provocações e os desvios, cativantes e cativeiros, pode não ser nada, no fim das contas. Podemos embarcar em ilusões e viagens sem sentido a todo instante, sem nem mesmo nos darmos conta. O que resta de nós persiste encoberto, se antecipamos o derradeiro encontro com frágeis previsões. Continuamos sozinhos, imersos em tanta bobagem.

Pude contemplar hoje uma das raridades da vida, que ainda nutre os olhos com o vigor do som e do estardalhaço. Pude ver um pássaro mirando o horizonte, de pé, à beira da minha sacada. Ele se comunicava com outros pássaros, numa linguagem bela, oculta, privativa àqueles que compartilham com ele da mesma realidade.

O pássaro se manteve presente, no momento que o tempo lhe proporcionava. Não pensava no antes ou no depois. Apenas estava. E, assim, pôde viver juntamente com os seus. Lembrando essa história me atino para as tanta ocasiões nas quais me vi imerso em pensamentos, seguindo trilhas e mais trilhas, perambulando pelas ideias a fio. E quantas vezes estive com elas? Mal as tinha visualizado, elas fugiam. Assim me sucedeu tantas vezes.

A prisão dos sentidos e das ideias é tortuosa. Ela guarda várias rotas de fuga. Mas é preciso querer sair do cativeiro. Se cativados, somos captivos. Não exploramos genuinamente nossa morada. Percorremos caminhos, sem aproveitar a paisagem. Aprendamos com os pássaros, que miram o horizonte e com ele dialogam, olhando para si mesmos e enchendo-se do universo que, a cada instante e em cada coração, perpetuamente desabrocha.